terça-feira, 18 de novembro de 2008

primeira namorada

Minha primeira namorada não foi um porquinho da índia, foi uma abelhinha.
Tinha 7 anos, e nas horas de recreio da escola, voavam dezenas de abelhas atrás de nossos copos gigantes de fanta uva, ziguizagueavam todas gorduchinhas suas bundinhas, rebolando e zunindo, como se pedissem açucar e afeto. Foi assim que me apaixonei por uma abelhinha. As outras meninas morriam de medo delas, gritavam, saiam correndo e abandonavam seus laches no pátio. Eu não.
Acontece que assim que acabava de tomar meu refrigerante os pequenos serezinhos iam-se embora pelo ar, sumindo por entre as folhas das árvores.
Pensando numa forma de tê-las só pra mim, resolvi num belo dia tapar a boca do meu copo respingado de doce com plástico filme assim que a abelhinha entrasse. Pronto. Estava ela lá, zunindo feito louca, debatendo-se contra as paredes pegajosas e escorregadias do copo de plástico vermelho.Era natural que um animal selvagem não compreendesse a princípio a vida civilizada, os relacionamentos de verdade.
O importante é que agora eu tinha uma abelha de estimação! Tratei logo de fazer pequenos furos no plástico com a ponta de uma lapiseira pra que ela pudesse respirar (mas as abelhas respiram?) e assim viver por muito tempo. O copo ocupava lugar central na minha escrivaninha, como os aquários dos grandes restaurantes.Éramos felizes.
Passados 2 dias, quando chegara da escola, corri para dar boa tarde à abelhinha e brincar de sonhar. Encontrei-a deitadinha de lado no fundo do copo, com as asas murchas. De nada adiantou chacoalha-la, dar leves palmadinhas no copo para que despertasse do seu sonho de mel, ela continuava estática.
Se arrependimento matasse... como poderia eu ter me esquecido de alimentá-la com grãos de açucar todo esse tempo? Acabara de matar minha cria. Comecei a imaginar como seria morrer de fome e conclui que o mínimo que eu poderia fazer pela pobre seria um belo funeral, com direito à reza, música e coroa de flores.
Quando tudo estava pronto no jardim de casa, voltei para recolher o corpo. Lá fora sua cova já estava cavada, só faltava rezar o pai nosso, benzê-la com uma gota de suco de uva, dar-lhe o único beijo e despedir-me com sussurros e silêncios.
Descobri o copo e deitei na minha mão o pequeno defunto. Como se tirasse de um último segundo o fôlego de vida, a abelha contorceu-se como um nó e cravou seu medonho ferrão no meu dedo.
Dei um grito, lancei o pequeno corpo contra a parede, arranquei-lhe as asas com as pontas das unhas e pisoteei-a, várias vezes e com todo o peso do meu corpo,estalando os joelhos com força, até que todo o amarelo tivesse preto e todo preto amarelado e não restasse mais nada.
Fechei a porta, fui jantar.
Foi aí que eu entendi por que existem tantos divórcios pelo mundo.

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